FRONTALIDADE E BOA
EDUCAÇÃO
Adquiri, há
tempos, as actas de um colóquio, realizado em Paris no início dos anos noventa do século passado,
que versava o tema em epígrafe. Mais de uma dúzia de sábios debatia um conjunto
de questões que se põem hoje a todo o homem sério e honesto sobre as regras de
boa educação que desde a Paideia da
velha Grécia à Humanitas da Roma
antiga, passando pelos contributos renascentistas e de outros períodos
históricos, chegaram até nós, e as correntes individualistas que, sobretudo
após Maio de 68 e a sua infantil e contraditória expressão é proibido proibir, subverteram essas mesmas normas e criaram a
falsa noção de sinceridade ou de frontalidade que tanto adorna hoje a desbocada
conversa de alguns adultos que não passam, afinal, de adolescentes mal criados.
Todos sabemos que
a chamada boa educação é uma questão de berço; de criação, diz-se em português
de lei. E a cultura pode, e deve, torná-la ainda mais fina e requintada. Nada
perde com isso; pelo contrário, só tem a ganhar. Um homem culto é, naturalmente,
um ser superior, também, e sobretudo, porque é extremamente bem educado. Aliás,
as normas de boa educação devem fazer parte integrante da sua formação.
Por isso, seria
bom que de novo se ensinassem nas escolas públicas, como outrora era norma nos
colégios privados, noções de cortesia, de civilidade ou de urbanidade, de bem
maior utilidade prática para os nossos alunos do que algumas disciplinas
esotéricas que a ninguém aproveitam e ninguém entende. Desde sempre a boa
pedagogia soube defender a necessidade de incutir nos jovens as correctas
normas de sã convivência social que revelassem respeito e consideração pelo
próximo, evitando, assim, a linguagem agressiva e insultuosa que hoje parece
ser regra e norma comum, fruto da moderna frontalidade, que os faz regressar à
selva profunda, com os urros e grunhidos das manifestações a que,
lamentavelmente, já estamos habituados.
Mas não são apenas
os mais novos que devem ser alvo de uma educação correcta que os torne gente
civilizada. Parece que mais necessitam alguns adultos que bem ganhavam em ler,
com mão diurna e nocturna, as cartas de Cícero que, com toda clareza, nos
transmitem o que já os romanos sabiam: distinguir a linguagem do camponês –rusticus – da do homem bem educado que
vivia na cidade - urbanus. Conheciam, por isso, a cortesia –
comitas – e a arte de ser amável, ou
seja, a humanitas. Pois não lhes era
então estranha a vida de sociedade – a urbanitas
-, porque possuíam aquilo a que os atenienses chamavam a elegância da boa
convivência.
Mas hoje parece
que a grosseria, a boçalidade e a má criação são a regra de oiro de alguns
homens públicos, apoiados e até instigados por jornalistas de igual teor. A
linguagem avinhada tornou-se, nalguns casos, a anormal norma com que bolsam
insultos e revelam em toda a sua plenitude a falta de nível, de cultura, de inteligência
e, acima de tudo, de educação. Portugal esteve, há pouco mais de um quarto de
século, à beira de ficar com uma linguagem
de caserna. Parece que agora caminha a passos largos para uma linguagem de taberna.